O Acordo UE-Mercosul, um dos tratados comerciais mais aguardados das últimas décadas, enfrenta novos e decisivos obstáculos às vésperas de sua possível assinatura. Nesta terça-feira (16), o Parlamento Europeu aprovou mecanismos de salvaguarda mais rígidos para importações agrícolas, adicionando uma camada extra de complexidade às negociações que já duram 26 anos.
A medida representa um passo significativo, porém controverso, para que o pacto possa ser finalmente selado entre os dois blocos. O texto aprovado pelos parlamentares endurece consideravelmente a proposta original apresentada pela Comissão Europeia em setembro. O objetivo central é criar dispositivos que permitam a suspensão temporária dos benefícios tarifários concedidos aos países do Mercosul, caso a União Europeia julgue que suas importações estão prejudicando produtores locais.
Com essas alterações no Acordo UE-Mercosul, inicia-se agora uma corrida contra o tempo. Os parlamentares precisam negociar um consenso com o Conselho Europeu, órgão que representa os governos do bloco e que havia apoiado a versão anterior, menos restritiva. Segundo informações da agência Reuters, essas negociações começam já nesta quarta-feira (17).
A corrida para a assinatura em Foz do Iguaçu
A agenda diplomática está intensa. O Conselho Europeu tem reuniões agendadas para as próximas quinta (18) e sexta-feira (19), mantendo viva a expectativa de que o acordo possa ser votado e aprovado ainda nesta semana. O cenário ideal, desenhado pelos defensores do tratado, prevê que Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, viaje para a Cúpula do Mercosul, que ocorre neste sábado (20), em Foz do Iguaçu, no Brasil, para a assinatura solene.
Entretanto, para que o Acordo UE-Mercosul se concretize na data prevista, von der Leyen necessita do aval prévio dos países-membros, o que expõe as fraturas políticas dentro do bloco. De um lado, a França, historicamente protecionista com seu setor agrícola, pressiona pelo adiamento da votação para 2026. Do outro, a Alemanha, maior economia do continente, defende a assinatura imediata do tratado nesta semana.
Entenda as salvaguardas que afetam o Acordo UE-Mercosul
As salvaguardas recém-aprovadas estabelecem critérios específicos e rigorosos sobre quando a UE pode retirar as vantagens tarifárias. Na prática, o texto define que, se as importações de um produto agrícola considerado “sensível” aumentarem 5% na média de três anos, a União Europeia terá autoridade para abrir uma investigação visando a suspensão dos benefícios.
Além do volume, o preço também é um fator determinante. Os parlamentares exigem que a Comissão Europeia intervenha caso o preço de uma mercadoria do Mercosul seja pelo menos 5% inferior ao produto similar europeu. Vale ressaltar que, na proposta original de outubro, esses limites eram mais flexíveis, fixados em 10%. Agora, busca-se um meio-termo entre as nações.
Outro ponto crucial do novo texto é a exigência de conformidade com os padrões de produção. As salvaguardas do Acordo UE-Mercosul poderão ser acionadas se for comprovado que as importações não seguem as mesmas normas ambientais e sanitárias exigidas dos produtores europeus.
O eurodeputado espanhol Gabriel Mato, relator do texto, celebrou a decisão como uma garantia de segurança: “O Parlamento Europeu enviou uma mensagem clara hoje: podemos avançar no acordo com o Mercosul sem deixar nossos agricultores desprotegidos”. Segundo ele, o mecanismo é sólido e permite reações rápidas a perturbações de mercado.
Reação do agronegócio e impacto nas exportações
Enquanto a Europa vê as medidas como proteção, o agronegócio brasileiro as encara com apreensão. Para o setor produtivo nacional, as novas regras soam contraditórias ao espírito de livre comércio que fundamenta o Acordo UE-Mercosul.
Sueme Mori, diretora de relações internacionais da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA), expressou preocupação de que tais salvaguardas limitem o potencial exportador do Brasil. “A União Europeia não veio aqui perguntar para o Brasil, Paraguai ou Uruguai se concordávamos. O que vai ser assinado no dia 20, se for assinado, é o texto negociado pelos dois blocos”, afirmou Mori, destacando a unilateralidade das novas exigências.
O Brasil, como potência global na produção de alimentos, seria um dos maiores beneficiários do tratado. Atualmente, o bloco europeu já ocupa a posição de segundo maior cliente do agro brasileiro, ficando atrás apenas da China e superando os Estados Unidos.
O que está em jogo para o setor produtivo
Em sua essência, o Acordo UE-Mercosul prevê a eliminação de tarifas de importação para 77% dos produtos agropecuários que a Europa compra do bloco sul-americano. Isso representaria um salto nas vendas de itens como café, frutas, peixes, crustáceos e óleos vegetais, cujas taxas seriam zeradas gradualmente em prazos de 4 a 10 anos.
No entanto, produtos considerados “sensíveis” pelos europeus, que competem diretamente com a produção local, como carnes bovina e de frango, não terão tarifa zero irrestrita, mas sim cotas de exportação definidas. As novas salvaguardas adicionam uma camada de risco a essas cotas, permitindo que a Europa feche as portas caso sinta sua economia interna ameaçada, o que mantém o setor produtivo brasileiro em estado de alerta máximo até a decisão final neste sábado.
Leia mais:
Governo Trump firma histórico Acordo EUA-Paraguai para atuação militar na América do Sul
França age para bloquear Acordo Mercosul-UE
Brasil e China: laços comerciais e recorde de investimentos
Siga nosso perfil no Instagram, Tiktok e curta nossa página no Facebook
📲Quer receber notícias direto no celular? Entre no nosso grupo oficial no WhatsApp e receba as principais notícias em tempo real. Clique aqui.

