Desconhecimento sobre leis antirracistas e baixa confiança no sistema de denúncias reforçam cenário de vulnerabilidade
Um levantamento divulgado na última quarta-feira (19), às vésperas do Dia da Consciência Negra, mostra que a maioria da população preta e parda ainda desconhece os canais formais para denunciar racismo. Segundo a pesquisa, 52,2% afirmam não saber onde ou como registrar situações de racismo ou injúria racial. O estudo revela ainda que apenas 47,5% conhecem legislações voltadas ao enfrentamento à discriminação racial.
A falta de informação não é o único obstáculo. Apenas 20,3% dos entrevistados acreditam que uma denúncia realmente será encaminhada para investigação e que providências serão adotadas pelos órgãos competentes.
O levantamento ouviu 423 pessoas, sendo 310 pretas e 113 pardas de todas as regiões do país, por meio de formulário online, entre julho e setembro. A investigação foi realizada pelos institutos Orire e Sumaúma, ambos da sociedade civil, com apoio da Uber.
Os dados também mostram que o racismo está presente no cotidiano: 59,3% relataram já ter sofrido racismo ou injúria racial durante deslocamentos na cidade. Apesar disso, 83,9% nunca formalizaram boletim de ocorrência.
“Abismo informacional” dificulta denúncias
Para Thais Bernardes, fundadora do Instituto Orire, os resultados evidenciam um distanciamento entre a população negra e os mecanismos de denúncia.
Ela afirma que há um “abismo informacional”, explicando:
“Uma estrutura que faz com que o caminho da denúncia seja confuso, seja pouco acessível e, muitas vezes, até desencorajador.”
Segundo a jornalista, que também está à frente do portal Notícia Preta, a baixa taxa de retorno para quem denuncia, apenas 1,7% recebem algum tipo de resposta, demonstra que o problema ultrapassa o âmbito pessoal.
“É estrutural, um sistema que não se comunica com quem mais precisa dele.”
Thais ressalta ainda que a ausência de informação e a falta de acolhimento institucional afetam diretamente a confiança das vítimas:
“O desconhecimento é também uma forma de violência.”
Mesmo diante das dificuldades, o estudo revela que 77,1% sabem diferenciar racismo de injúria racial, crimes distintos na legislação brasileira.
Medidas essenciais para enfrentar o racismo
Para Thais Bernardes, o combate ao racismo exige mais do que conhecer leis: são necessárias políticas públicas, profissionais preparados para atender vítimas e mecanismos que garantam investigação e punição dos casos.
“O conhecimento empodera, mas são as ações estruturais que interrompem o ciclo de violência.”
Ela reforça que o atendimento no sistema de Justiça precisa ser humanizado:
“Se quando a pessoa chega na delegacia é desencorajada, desrespeitada ou até mesmo ridicularizada, então, o sistema de Justiça também precisa ser educado em antirracismo e atendimento humanizado.”
Guia prático orienta vítimas
Além da pesquisa, o projeto “Percepções sobre Racismo e os Caminhos para a Justiça” elaborou um guia com instruções sobre como denunciar discriminação racial e informações sobre leis vigentes. A parte jurídica foi produzida pela rede global Black Sisters in Law.
O material explica que não é obrigatório contratar advogado para registrar ocorrências e que o boletim pode ser feito presencialmente ou pela internet, em qualquer delegacia comum ou especializada.
O guia destaca dispositivos legais como a Lei Caó (1989), que torna o racismo crime imprescritível e inafiançável, e o Estatuto da Igualdade Racial (2010).
Onde denunciar
Thais recomenda que vítimas procurem delegacias, Ministério Público, Defensoria Pública, ouvidorias e plataformas oficiais. O governo federal também mantém o serviço telefônico Disque 100, canal gratuito para denúncias de violações de direitos humanos.
Segundo o Censo 2022, pessoas pretas e pardas representam 55,5% da população brasileira.
*Com informações da Agência Brasil
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