Os registros de estupros disparam na Amazônia Legal e apresentaram um crescimento alarmante de 4% entre 2023 e 2024, contrastando com a variação negativa de 0,3% observada no restante do país no mesmo período. A revelação faz parte da 4ª edição do estudo Cartografias da Violência na Amazônia, divulgado nesta quarta-feira (19) pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), em parceria com o Instituto Clima e Sociedade, Instituto Itausa, Instituto Mãe Crioula e Laboratório Interpretativo Laiv.
Em 2024, a Amazônia Legal, composta pelos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins, totalizou 13.312 registros de violência sexual. Este número representa uma taxa chocante de 90,4 casos por 100 mil habitantes, um índice 38% superior à média nacional. Preocupa ainda o perfil das vítimas: cerca de 77% delas tinham 14 anos ou menos.
Amazonas lidera o aumento, enquanto facções reforçam controle territorial
O estudo aponta que o crescimento das facções criminosas na região é um fator que se relaciona com a alta dos casos de estupros na Amazônia. Atualmente, a presença desses grupos atinge 45% das cidades da Amazônia, e esse avanço territorial tem se manifestado de maneira brutal no controle social e de gênero.
Entre os nove estados, o Amazonas registrou a maior alta, com um aumento expressivo de 41% nos registros de estupros, passando de 951 para 1.353 casos. O Tocantins foi o único estado a apresentar uma queda significativa, de 9%.
| Estado | Registros em 2023 | Registros em 2024 | Variação Percentual |
| Amazonas | 951 | 1.353 | +41% |
| Acre | 736 | 860 | +16% |
| Amapá | 625 | 715 | +14% |
| Maranhão | 1.594 | 1.811 | +14% |
| Roraima | 729 | 848 | +13% |
| Rondônia | 1.501 | 1.491 | -1% |
| Pará | 5.011 | 4.815 | -4,5% |
| Mato Grosso | 514 | 483 | -7,5% |
| Tocantins | 1.014 | 934 | -9% |
A lógica machista das facções e a relativização da violência sexual
Isabella Matosinhos, pesquisadora do FBSP, ressalta que a escalada dos estupros na Amazônia não tem uma única causa, mas as divisas com outros países e a consequente vulnerabilidade em áreas de fronteira, somadas à lógica interna das facções, contribuem para o cenário.
“A forma como as dinâmicas de relacionamento, a lógica que guia as masculinidades dentro das facções, são lógicas muitas vezes machistas. Então, não tem como a gente pensar que isso não vai se refletir nas práticas de violência contra a mulher,” explica Matosinhos. Ela argumenta que o crescimento das facções está intimamente ligado ao crescimento dessas taxas de estupro.
A violência contra a mulher chega a ser relativizada pelos grupos criminosos. A especialista questiona se, na prática, antes de uma condenação, “se um homem, faccionado ou não, comete uma violência sexual, será que é claro que isso é uma violência sexual?”.
Facções ditando regras comportamentais para mulheres
O estudo do FBSP identificou, através de entrevistas, que as organizações criminosas estão exercendo um controle social estrito, criando “regras de comportamento” que afetam tanto mulheres ligadas aos integrantes quanto aquelas que residem apenas nos territórios dominados.
O controle se manifesta em três níveis:
-
Mulheres Relacionadas a Faccionados: São submetidas a uma fiscalização rígida de seus vínculos pessoais e até mesmo das roupas que podem vestir. Em situações extremas, precisam de autorização da facção para encerrar relacionamentos.
-
Mulheres em Territórios de Facções: Mesmo sem ligação com os grupos, são alvo de sanções que incluem a proibição de “fofocas” ou de se envolver com membros de grupos rivais. As punições variam de humilhações públicas a castigos e até execuções sumárias.
-
Mulheres Integrantes de Facções: São relegadas a funções de apoio, sem acesso a cargos de liderança. A violência de gênero é usada como ferramenta de disciplina para mantê-las em baixo status e sob alto risco de serem detidas, muitas vezes atuando na venda de drogas. “Não é coincidência, é muito por causa dessa violência de gênero, mesmo, que coloca também os homens mais em condições superiores, lugares de mais prestígio”, afirma a pesquisadora.
Outros indicadores de violência e criminalidade na região
O estudo Cartografias da Violência na Amazônia trouxe outros dados cruciais que evidenciam a complexidade da segurança pública na região:
-
Mortes Violentas: Caíram para 8.047 em 2024, mas a taxa regional permanece 31% acima da média nacional. O Maranhão é o único estado da Amazônia Legal a ter alta na taxa de homicídio (+11%), enquanto o Amapá lidera o ranking de violência.
-
Conflitos no Campo: O Pará e o Maranhão estão na liderança dos conflitos no campo, com um recorde de 1.317 casos em 2024, alta de 20% em relação ao ano anterior.
-
Feminicídios: A taxa na região amazônica é 19% superior à média nacional.
-
Tráfico de Drogas: A apreensão de drogas na Amazônia Legal subiu 21% em 2024. A Polícia Federal apreendeu 118 toneladas de cocaína na região entre 2019 e 2024, um aumento de 84,8% no período.
A presença crescente e o controle imposto por facções, juntamente com a alta nos estupros na Amazônia, reforçam a necessidade urgente de políticas públicas coordenadas e eficazes para proteger as populações vulneráveis e desarticular a crescente influência do crime organizado.
*Com informações do G1
Leia mais:
Megaoperação no Rio tem policial morto, civis baleados e criminosos usando drones-bomba
Governo Federal diz que atendeu a pedidos de Força Nacional no RJ
Megaoperação no Rio contra o crime deixa 64 mortos e mais de 100 presos
Siga nosso perfil no Instagram, Tiktok e curta nossa página no Facebook
📲Quer receber notícias direto no celular? Entre no nosso grupo oficial no WhatsApp e receba as principais notícias em tempo real. Clique aqui.

