“A educação não acontece mais somente nas salas de aula. Ela não tem mais esse formato fixo, estagnado, e ela não acontece mais somente por meio dos materiais de antigamente, como livros e cadernos. Ela hoje está em todos os espaços, e já ultrapassou os muros da escola”, diz a professora de língua portuguesa da rede estadual do Amazonas, Adriana Antony.
O uso de ferramentas tecnológicas na educação não é novidade, principalmente no contexto do pós pandemia. Mesmo assim, as ferramentas de inteligência artificial (IA) ainda causam polêmica entre professores e alunos.
Nas últimas semanas, o chatbot com IA ChatGPT apareceu nas manchetes por todo o mundo ao se tornar o aplicativo de crescimento mais rápido da história. Em apenas 2 meses, o robô alcançou a marca de 100 milhões de usuários mensais.
A ferramenta se destaca por imitar com precisão a forma humana de se expressar com texto. De acordo com o próprio ChatGPT, ele “estudou” músicas, livros, artigos, notícias, blogs, conversas, e diversos outros tipos de textos escritos por autores humanos para conseguir escrever textos completos da forma mais natural possível em meros segundos, utilizando a probabilidade para calcular a resposta mais adequada a uma pergunta feita pelo usuário.
Em resposta à utilização do ChatGPT por estudantes no contexto escolar, o Departamento de Educação de Nova York proibiu o uso do aplicativo nas escolas por conta da preocupação dos professores com o aprendizado dos alunos.
Brasil
No Brasil, instituições educacionais como o SESI e o SENAI utilizam a IA em suas plataformas digitais desde 2019. O SESI utiliza em suas escolas sistemas de tutores inteligentes para ensino personalizado, enquanto o SENAI possui plataforma que oferece orientação profissional por meio de inteligência artificial.
Outro exemplo de utilização da IA na educação é a Imaginie, uma das maiores plataformas de correção de redações do Brasil, que possui uma ferramenta de inteligência artificial própria para servir de auxiliar no treinamento de redação para vestibulares.
“A IA pode ser usada para ajudar no treinamento para a redação do Enem de várias maneiras. [A inteligência artificial] pode fornecer a você um tópico ou pergunta para escrever um texto, permitindo que você pratique sua habilidade de redação em resposta a um tema proposto. [A IA] também pode fornecer sugestões e correções gramaticais para ajudar você a melhorar sua escrita”, explica Daniel Machado, criador da plataforma Imaginie.
IA nas escolas: Prós e contras
A realidade do sistema educacional brasileiro ainda é majoritariamente pautada na educação tradicional, que encontra dificuldade em considerar a individualidade de cada aluno. Nesse contexto, entram as ferramentas de IA, que podem servir como “ajudantes” no ensino personalizado.
Para Daniel Machado, a IA possui quatro grandes usos no ensino de redação e língua portuguesa:
- Correção gramatical e ortográfica;
- Análise de coesão e coerência;
- Sugestões de vocabulário e estilo;
- Avaliação de similaridade com textos antigos.
As ferramentas de inteligência artificial são especialmente úteis para estudantes que têm dificuldades com gramática e ortografia, permitindo que eles melhorem sua escrita, evitem repetições e expandam seu vocabulário de forma eficiente. O recurso também permite que o professor economize tempo e aplique seus esforços em pontos mais abstratos e de suma importância, como argumentação e pensamento crítico.
Essa é a grande fraqueza da IA: Segundo as próprias palavras do ChatGPT ao ser perguntado sobre temas polêmicos, “Um robô não possui opinião ou senso crítico”. Mesmo em plataformas como a Imaginie, a inteligência artificial não substitui a prática constante, feedbacks de educadores e o estudo cuidadoso dos tipos de textos e habilidades exigidas pelo sistema educacional.
A professora Adriana Antony destaca que o papel da escola é formar um indivíduo crítico, argumentador, livre de amarras, e que isso só é possível ao “mexer nas estruturas e abrir caixinhas que estavam há muito tempo fechadas”.
O desenvolvimento crítico provocado por argumentações, debates, discussões e estudos em sala de aula não podem ser substituídos por nenhum recurso tecnológico. Robôs como o ChatGPT servem como ferramenta auxiliar de aprendizado, e nunca como um “sucessor” das salas de aula. Nesse contexto, nascem empecilhos como a dificuldade de identificar textos plagiados, uma vez que cada texto criado pela IA é único.
A inteligência artificial recebe treinamento baseado em textos escritos por humanos, então os textos criados reproduzem falas de autores humanos, que nem sempre são fontes confiáveis. Notícias falsas, argumentos obsoletos e falas preconceituosas são uma possibilidade, o que torna ainda mais importante a desenvoltura crítica do estudante ao utilizar esses recursos.
Ainda é necessário um compromisso contínuo com o desenvolvimento de habilidades críticas, pensamento criativo e pensamento crítico, e o desenvolvimento de habilidades sociais e emocionais, que não podem ser facilmente automatizadas.
O futuro da IA na educação
A inteligência artificial nas escolas ainda não é tão comum no Brasil, portanto ainda há uma resistência. O medo é um fator importante: Medo de perder o emprego para máquinas, de não conseguir utilizar esse recurso de forma adequada, de adaptar um sistema inteiro, preocupações com privacidade e segurança de dados, etc.
Outro ponto importante é a desigualdade social no país. Escolas públicas e particulares não possuem os mesmos recursos e não seria possível implantar a inteligência artificial em todas as escolas sem que seja instalado também uma estrutura adequada para tal. Educadores temem que a IA possa aumentar a desigualdade e a exclusão social ao marginalizar certas comunidades ou grupos de pessoas.
As ferramentas de IA podem desempenhar um papel importante na educação de futuros alunos, mas é necessário cuidado e um extenso diálogo com governantes e a sociedade como um todo para compreender seus limites e maximizar seus benefícios.
“É importante incentivar o diálogo aberto e honesto sobre a IA, bem como investir em programas de educação que ajudem a capacitar professores e alunos para lidar com essas novas tecnologias de maneira crítica e reflexiva”, aponta Daniel. “É importante lembrar que a IA não é uma panaceia para os desafios enfrentados pela educação.”
A professora Adriana é otimista em relação ao futuro das ferramentas tecnológicas nas escolas públicas e particulares: “Ainda temos muito o que caminhar, mas o mundo está avançando e nós, professores, temos que avançar também.”